A edição da vida

Hoje se fala muito dos avanços das neurociências, do papel do cérebro e seus sistemas na nossa vida, da química cerebral através de neurotransmissores, enfim, deste incrível computador que temos em nosso corpo, com suas imensas possibilidades. É fascinante que, através de tomografias, ressonâncias, ultrassonografias, possamos hoje entender como as várias regiões do cérebro interagem entre si na percepção de estímulos externos e respostas às diversas situações que nos acontecem.
Não podemos, entretanto, apesar da relevância de todas estas descobertas, nos esquecer de algo muito importante: não somos máquinas! Além de aspectos biológicos e químicos que em parte determinam o modo como agimos, existe a nossa relação com o meio, existem nossos relacionamentos, os acontecimentos do dia, as lembranças do passado, as expectativas quanto ao futuro. Enfim, temos um cérebro maravilhoso, temos o DNA e todo o aparato orgânico da espécie humana, mas, sobretudo, cada um de nós tem a “sua história”. Sim, o que nos faz ser quem somos é principalmente nossa história de vida, com tudo de bom e de ruim que vivemos, com as crenças que construímos, as experiências que tivemos e, principalmente, os significados que atribuímos a tudo o que nos acontece.
Quando falamos de nossa história pessoal, precisamos entender que, assim como uma notícia pode ser contada de diversas formas, dependendo do ponto de vista, tecemos também sobre ela uma espécie de narrativa. Nossa própria história é sempre, de certo modo, uma edição, na qual escolhemos que pontos vamos destacar, que episódios vamos deixar de lado, que ângulo será a principal referência. Mas, assim como uma notícia fora do contexto já não é o fato, mas uma versão do fato, que pode estar mais ou menos correta, nossa narrativa pessoal está sujeita também a distorções, erros de interpretação etc., o que pode determinar o modo como nos vemos, como vemos a vida e as outras pessoas, sendo às vezes algo benéfico ou até mesmo muito prejudicial. Assim, nosso olhar sobre nós, sobre as pessoas e acontecimentos, muitas vezes precisam ser passados a limpo, revisados, para que possamos viver melhor. É isto o que a psicoterapia, ou os processos de autoconhecimento como Mindfulness, podem fazer por nós. Será que você está adotando a melhor versão de si mesmo e da sua história para que ilumine o seu presente ou futuro ao invés de lançar um véu de sombra sobre o seu cotidiano? A resposta a esta pergunta pode ser essencial para a nossa felicidade.

Por: Flávio Gonzales